segunda-feira, 4 de junho de 2018

Se não por ingenuidade, a crise é proposital e de cunho político


             
Eu vivi num tempo, não muito distante, em que muitos usavam essa frase retórica: “De que adianta ter carro e não ter dinheiro para colocar gasolina?”  As pessoas mais conscientes de sua realidade financeira não se atreviam a comprar um automóvel. 

            Essa frase levantava uma crítica sobre aqueles que “colocavam o chapéu onde não podiam alcançar”, mas que achavam que “agora o governo vai olhar para os pobres”;  a frase  também era vista como uma maneira de expressar uma indignação, dependendo do contexto em que era dita. 

          A gasolina barata é um sonho antigo, mas todos que possuem carro tem condições de abastecê-lo com tranquilidade, sem  apertar o orçamento de outras áreas? Estão com seus veículos em dia e com manutenção adequada? Vale a pena contentar-se apenas com o que se tem? O caso é bem mais grave. Ainda somos um povo que se contenta com o pouco e continua fazendo piada com coisa séria. 

O povo ainda consegue "brincar" com o que deveria refletir para
buscar mudanças. 


        O  povo sempre pagou o preço. E muito alto, sem nenhuma outra fonte de renda e pouco entendimento de economia pessoal e familiar. A ideia de que dinheiro é para gastar, custou muito caro para muitos.  Mas o povo pagou, até por teimosia e tentativa de mostrar que pode. O governo também é assim; trabalha nessa mesma linha: gastar, gastar, sem investir.  Distribui os frutos da árvore sem cuidar dela, sem observar que seu viço já não é mais o mesmo, que ela está envelhecendo e precisando de atenção especial.   
      As crises vão e voltam mais por uma questão de poder político do que pela ação de governar bem, promovendo o progresso e investimento em infraestrutura capaz de fazer a máquina governamental funcionar bem, independentemente de quem esteja no poder, sem interesses partidários ou fazer da política um meio de vida para grupos distintos que ascendem no cenário e se colocam como se fossem insubstituíveis. O mau gerenciamento de uns, acaba abrindo novos discursos de que alguém pode fazer melhor. Mas a estrutura é a mesma. 
        É assim, nesse cenário,  que surgem os “salvadores da pátria” que maquiam a realidade do país mascarada por uma falsa sensação de prosperidade como algum tempo atrás, com a baixa de impostos que favoreceu a população menos aquinhoada a adquirir automóveis; e o discurso ufanista de que "o pobre agora pode andar de avião" por incentivos a empresas aéreas. 

         De fato, quem ganhou com isso foram essas empresas. Que significado tem o incentivo para uma pessoa viajar de avião ou por qualquer outro meio de transporte se na vida real, em seu dia a dia não tem qualidade de vida em questões atinentes aos serviços de responsabilidade do governo, como educação, saúde, segurança, esses pontos sempre explorados em campanhas eleitorais e nunca resolvidos?  A massagem do ego dos pobres por ilusões fantasiosas de que pode viajar com os ricos nos aviões, serve apenas como anestésico para um povo sem instrução e autoestima. 

     A população viveu uma ilusão de que podia viver como ricos, ter também o que somente os ricos tinham; que a empregada podia comprar o mesmo perfume que a patroa usava. Mas era um momento de ilusão. A falsa sensação de prosperidade furtou um olhar abaixo da superfície para observar o que acontecia nesse momento e o que viria depois. De que adianta viajar de avião e não ter o que comer em casa? De que adianta o jovem possuir um tênis e roupas de grife e não ter educação? De que adianta comprar um carro e a financeira entrar com ação de busca e apreensão por inadimplência?  A política baseada no incentivo ao consumo, que enriqueceu os ricos com incentivos fiscais para a produção,  por outro lado levou ao endividamento famílias cuja fonte de renda era apenas um emprego inseguro num país sem desenvolvimento real. A conta é sempre paga por esses trabalhadores que ainda acreditam em “milagre político”. O quanto pior, melhor, (para quem?) sempre faz o povo sentir saudade, não porque antes era melhor, mas porque era menos pior. E assim se contentam, debruçados em comparações em discursos acalorados que não operam nenhuma mudança, pois a comparação não tem o poder de mudar uma realidade já instalada e acaba desviando o olhar das causas mais profundas. 

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