terça-feira, 17 de abril de 2018

Jornalista ou porta-voz?

         
Quando iniciei no radiojornalismo nos anos 80, meu diretor dizia: "A opinião pública é burra; ela vai sempre se embasar naquilo que ouve e que vê por fora para dizer qualquer coisa. As pessoas terão como verdade o que assistem nos grandes noticiários de rádio e televisão. Mas a verdade pode estar por detrás das cortinas". 

Ele dizia isso exatamente para nos orientar de que, além de ouvir as pessoas de determinados movimentos organizados, é preciso saber o que está por trás desses movimentos, o por quê de cada coisa para que a informação seja esclarecedora, elucidativa e justa. Assisti certa vez a uma entrevista com o ex-governador do Rio de Janeiro, Leonel Brizola. Ele dava explicações sobre os arrastões feitos por menores nas praias, e criticou o que a televisão mostrava. "A câmera de televisão filma uma faixa de areia e diz que é um deserto". "A televisão pode mostrar o ângulo que quer e omitir outro", dizia. Brizola tentava explicar que o caso dos arrastões não era generalizado como parecia o destaque que a reportagem estava dando, levando terror à população. 

Nos últimos dias é possível perceber que grande parte da classe jornalística tornou-se porta voz de movimentos sociais. Dificilmente os repórteres apresentam informações complementares para elucidar determinadas questões.  São divulgadores de notas oficiais desses movimentos e reprodutores de palavras de seus representantes. Para que mobilizar equipes de repórteres ou jornalistas para cobrir determinado fato para mostrar aquilo que já está explícito e falar o que todos estão vendo? 

        Fiquei pensativo após acompanhar a entrada de uma repórter numa importante emissora para falar da ocupação do Triplex no Guarujá onde representantes do Movimento dos Sem Teto adentraram. A repórter repetiu as palavras do líder do movimento que disse ter se reunido com Lula para falar da ocupação. Lula teria dito: "Se o triplex é meu, é do povo".  

      A tentativa de desqualificar a justiça e bater na tecla de que Lula não é dono do imóvel sugerindo que o ex-presidente é inocente, foi perfeitamente entendido na notícia dada pela repórter ao simplesmente transmitir as palavras do líder do movimento, sem quaisquer outros esclarecimentos ao telespectador, como por exemplo, a menção de que Lula foi condenado por "ocultação de patrimônio" no caso do triplex, daí a ausência de documento de propriedade assinado por ele.

É preciso que jornalistas cumpram o papel de transmitir de maneira justa, honesta e não deixar pairar dúvidas que venham sonegar da sociedade o direito à informação. Por outro lado, são meros funcionários de empresas de comunicação que deveriam estar a serviço não apenas da informação, mas do esclarecimento. É o esclarecimento justo e sem nebulosidade que revela a imparcialidade. Por fim, não é preciso ser jornalista para ser um bom porta-voz. Isso é um desperdício. 

       

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